Artigo de Marisa Bueloni: Não vos preocupeis


03.09.2008 - Todos nós nos preocupamos o tempo todo, com tudo, com a família e com a casa, a saúde, o trabalho, pensamos no futuro, fazemos listas para as compras da semana, ficamos atentos aos pagamentos, aos compromissos, etc. Uns mais, outros menos, mas todos guardamos algum tipo de ansiedade a respeito das nossas preocupações.

Estou me lembrando de uma mensagem de Nossa Senhora, onde ela pede para lermos, todas as quintas-feiras, o Evangelho de São Mateus, capítulo 6, versículos 24 a 34. Nesta passagem, o Senhor nos diz que não devemos nos inquietar quanto à nossa vida, nem quanto ao nosso corpo, com o que havemos de vestir ou comer. O Senhor pede que olhemos as aves do céu: elas não semeiam, não ceifam, nem recolhem em celeiros, e o Pai do céu as alimenta. Nós valemos mais que as aves e não devemos nos preocupar.

Tentamos seguir a mensagem bíblica, até porque nos faz um grande bem este controle sobre a nossa ansiedade. Mas, acima de tudo, a bela lição da Palavra é a confiança na providência divina. Feliz é aquele que consegue se abandonar nos braços do Pai e viver da Sua santa providência. Bastando a cada dia o seu trabalho, o seu sustento.

Tudo isso me leva a refletir sobre os muitos casos de ansiedade e de pensamentos compulsivos, que levam pessoas às clínicas, aos hospitais, aos sanatórios, quase à beira do enlouquecimento, de tanto se preocuparem com os afazeres e a implacável rotina diária. Minha mãe (que cozinhava como poucos) costumava nos contar o caso de uma senhora que foi parar numa casa de recuperação para pessoas profundamente deprimidas, porque a mulher não sabia mais o que fazer de mistura no almoço...

A tal senhora encasquetou que esgotara o seu repertório culinário e já não tinha mais inventividade. Ficava angustiada ao pensar “no que fazer de mistura” e esta angústia foi assumindo uma dimensão patológica, a mulher se tornou ansiosa demais, foi se deprimindo gravemente, com crises de choro, e precisou ser internada. A princípio, o caso parece engraçado, mas pode-se sentir, no substrato desta alma, a grande e desconhecida dor.

Uma vez, fiquei sabendo de um caso bastante curioso. O marido exigia que a mulher fizesse feijão todos os dias. Não comia o feijão “de ontem”, de modo algum. Então, para que o feijão ficasse com caldo e boa consistência, a esposa cozinhava pelo menos meio quilo todo dia, quase que só para ele. Mas tem os detalhes: o feijão tinha de ser cozido apenas com água e sal. Nada de alho, cebola, temperos. E quando ele cismava que o sal não estava bom, andava a cidade toda, à procura de uma determinada marca de sal, do seu gosto.

O que a mulher ia fazer com aquele feijão feito todo dia, que certamente ia se acumulando na geladeira? Então, acabava dando para uma cunhada muito prendada, que o temperava à sua moda, para aproveitá-lo junto com os da sua família. E não era só o tal do feijão que tinha de ser feito todo dia. No jantar, o marido exigia uma canja com peito de frango, que, no final, não podia ter mais nenhum pedaço de peito. Ele só tomava o caldo. A canja também tinha de ser diária. Nada de sopa “de ontem”. O resto, era jogar fora.

Há pessoas que, no jantar, não comem nem mesmo o arroz do almoço. Penso nas mulheres que têm de fazer o arroz duas vezes no dia, para agradar o filho ou o marido, que não comem a torta feita ontem, nem as panquecas, nem o frango com legumes, nada. Esta abençoada criatura passa quase o dia todo diante do fogão e da pia, cozinhando, lavando panelas, enxugando, guardando, para amanhã começar tudo de novo, arroz feito na hora, feijão feito no dia, carne preparada hoje, torta tirada do forno, canja diária para o jantar.

Tudo isso me enche o coração de ternura e de compaixão, porque penso nas mulheres que enfrentam esta missão todos os dias, amarradas a um destino que talvez elas não tivessem escolhido. Qual é a graça de cozinhar feijão todos os dias? Só mesmo por um profundo sentimento pelo ser amado e porque isso o faz feliz.

Não vos preocupeis com o que haveis de vestir ou de comer, diz a Palavra de Deus. Olhai os lírios do campo, como são belos. Vicejam sob o sol, frágeis e desprotegidos, mas ninguém se veste com a sua glória. Benditas as mulheres, mães e esposas, que cozinham o alimento da família. Abençoadas são as mãos que sovam a massa. Belos são os corações que sabem reconhecer o trabalho de quem provê para todos os dias.

 

Marisa F. Bueloni é formada em pedagogia e orientação educacional

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